sábado, 20 de julho de 2019

Das feridas que curam

Conheci Rafael em São Paulo, quando fui lançar meu último livro. Ele foi a segunda pessoa a chegar na Patuscada depois de mim. Me cumprimentou pelo nome. Me senti mal por isso porque eu não fazia a mais vaga ideia de quem era ele, e ele sabia meu nome.

Passado o desconforto inicial, conversamos. Eu, ele e várias pessoas que começavam a chegar. Sobre cotidiano, sobre banalidades. Até ali eu não sabia que Rafael era escritor. Ao longo do evento, não interagimos. Fui voltar a falar com ele no final, quando ele gentilmente me ofereceu hospedagem na casa dele para eu não ir direto pro aeroporto e ficar lá por... 13 horas, como o fiz.

Com o tempo, ele me apresentou o "Amor, Beligerância", um libreto de apena 12 páginas (cabe destacar que nos apropriamos indevidamente do termo "libreto", que na verdade é o termo que designa as publicações que explicam os atos de uma ópera).



O libreto começa com uma explicação de que se tratam de textos curtos. Bom, obviamente uma publicação de 12 páginas não contempla um texto longo, mas, apesar de não ter a cara de pau de contrariar o autor, diria que se não tivesse lido a apresentação, julgaria se tratar de um texto único.

Romântico.

Há tempos não lia nada romântico. Acho que ando revoltada demais.

Um libreto romântico sobre o processo de cura depois de enfim aceitar a perda da pessoa amada. Metaforicamente, o que se compreende é que a relação vinha sendo mantida entre narrador e pessoa amada por medo da perda. Algo muito comum na vida real, inclusive. Aprender a abrir mão não é uma tarefa fácil.

Não foi para o narrador.

Os textos são mini ou micro contos que expressam a ferida, o tempo, o estranhamento da distância e do reencontro. Não há concretude na narrativa, ela se apresenta de uma forma um tanto poética embora breve. São sentimentos jogados por metáforas e palavras-chave que permitem ao leitor completar as lacunas com sua própria história.

Não sou ávida leitora de romances românticos - nada que me impressa de prestigiar o gênero - então foi uma experiência peculiar a leitura desses mini contos sobre o sofrimento pelo fim de um relacionamento ou sobre o reencontro amoroso.

Não conheço as outras obras do autor, não sei como ele lidaria com um romance, por exemplo, mas o projeto do libreto e suas 12 páginas em letras grandes carrega uma proposta interessante: contar uma história em poucas linhas. Na literatura universal sobram exemplos de histórias curtíssimas que se resolviam em si mesmas.

Claro que os textos contidos no libreto tinham espaço para maior desenvolvimento, mas é preciso respeitar a escolha estética do autor. Eles se resolvem em si mesmo, e isso é o bastante.
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Amor, Beligerância
Rafael F. Carvalho

2019
12 páginas
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Rafael F. Carvalho é contista, autor dos livros A Estante Deslocada, A Cor do Sal e Terceiro Livro.


~Maya

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