quarta-feira, 31 de julho de 2019

Dia de Matheus

Consigo imaginar Matheus Henrique, completamente ruborizado, escrevendo no inbox da página do Bibliofilia. Apagando. Escrevendo de novo. Apagando. Escrevendo e dando o "enter" com o coração na boca. Consigo imaginar pelo tom tímido do seu contato.

Oras, Matheus, sei que deixei claro, desde o início, que o blog teria curadoria para garantir uma mínima qualidade nesses espaço. Sei também que trago aqui resenhas de gente com bons anos de experiência nas costas, prêmios e o escambau.

Mas eles, eu, você, qualquer um que se aventure no mundo das letras, começa de algum lugar. E esse lugar, podes ter certeza, não é concorrendo ao Nobel.

Não tenham vergonha, jovens autores, de mostrar seu trabalho. Trabalho escondido não evolui. A crítica teve um papel crucial na caminhada de todos os maiores nomes, e dos médios, e dos que se pretendem grande um dia. O blog aqui não tem intenção de julgar ninguém, mas quem sabe de ser um espaço de crescimento?

Então Matheus tomou coragem e me mandou um conto e um poema.

Gostei de ambos.

Gostei como quem gosta de uma massa de bolo. Está gostoso assim, imagina quando estiver pronto?

Matheus já tem pegada (epa, não é isso que vocês estão pensando, sequer conheço o menino ao vivo!), já tem direção. Pode mudar no futuro, é verdade, mas os elementos da receita estão todos aí.

O que falta? Para alguns leitores talvez não falte nada, inclusive. Coragem de produzir mais e começar a bater na porta de editoras, quem sabe? Pra mim, pessoalmente, falta só a maturação, aquele processo que só o tempo traz, um toquinho de malandragem.

Gostei de conhecer Matheus. Gosto quando jovens autores me mostram seu trabalho e eu vejo um caminho ali. É bom pensar que o potencial tá todo ali. Ruim é estragar o sonho de alguém, o que não é o caso. Segue firme, Matheus, você está indo por um caminho bem legal.

Conheçam Matheus Henrique:


Moinho de Vento

O ato começa quando a mosca entra no meu quarto, já de noite.
Abrem-se as cortinas, focam-se as luzes, e eis no palco a bailarina.
Todo o teatro se desenrola entre minha rotineira leitura e o zum-zum dela, de um lado para o outro, de cima a baixo. Observei todo o espetáculo. Foi quando, descansando ela na parede, percebi a situação: a peça já havia acabado e ela não sabia voltar para casa.
Generoso que sou, aceitei a tarefa como que a um repto. Empunhei o guarda-chuva fechado, aquele pedaço de fibra de carbono enrolado em pano antiaderente, e esgrimei a bendita com vontade. O sabre zunia tão rápido que não sabia quem estava mais tonto.
Quando o braço não aguentava mais, troquei os avanços da tecnologia pela rudeza de uma vassoura. Não adiantou. Voava para fora da porta e voltava. Da janela nem chegou perto.
Começando a ficar irritado, decidi utilizar o dom que me difere da mosca: a idiotice. Apaguei a luz para encará-la no escuro. Eu não via e nem ela. A única visão? A janela. Minha esperança.
De repente, silêncio. Acendi a luz e não mais a encontrei.
No fundo, fiquei envergonhado.
Fecharam-se as cortinas, apagaram-se as luzes, e eis que estava sozinho no quarto.
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(sem título)

Ando tendo sonhos de canto,
de palavra falada, cantada,
sonho em ouvir minha voz em um tom mais bonito,
mais devagar
devagarinho
ser passarinho, gorjeando no fins de tarde,
no início das manhãs,
ser chamado sábio
sabiá dos caminhos
cantando, sem saber de notas e acordes,
sem instrumento, só voz, emoção e plateia a se sentir encantada
com outra voz na música popular brasileira
ou ser outra voz na beleza diária brasileira
de alguém.
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Me chamo Matheus Henrique, tenho 23 anos, sou nascido, criado e vivido entre capivaras, jacarés e araras na terrinha de Manoel de Barros, no pantanal campograndense. Sou formado em filosofia pela universidade federal do estado e escrevo literatura unicamente por prazer, para fazer da vida uma experiência mais bonita e curiosa. Sonho pelo dia que todos possam e saibam apreciar as riquezas infinitas da arte, o que não é nada mais do que as riquezas infinitas da vida.


~Maya


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